Nome original: Mama-na-Burra
Origem: Portugal
Conto: O homem da espada de vinte quintais
Ele nasceu por obra e graça do Espírito Santo. Ganhou a sua força graças ao leite da burra que o amamentou em jovem. Maneja uma espada que pesa uma tonelada ou, se descermos da Foz do Douro até ao Alentejo, uma bengala com o mesmo peso. Os seus cabelos foram transformados em ouro. Cortou a orelha ao Diabo e usa-a num colar, trincando-a para chamar o mafarrico sempre que precisa de ajuda. Ele chama-se Mama-na-Burra. Como não adorar uma personagem destas? E, mais importante do que isso, como é possível que um figurão destes não se tenha tornado um herói folclórico em Portugal, à semelhança de outras personagens bem menos interessantes noutros países?
Tamanha lacuna foi um dos motivos que me levou a incluí-lo no Felizes Viveram Uma Vez. Longe de me ver como o provedor dos bons costumes tradicionais, espero ainda assim conseguir chamar alguma atenção para um conto nacional que tão pouca gente conhece, e que é tão deliciosamente português na sua natureza picaresca e na mundanidade do seu imaginário, que devia no mínimo ser literatura obrigatória a par de A Dama Pé-de-Cabra. Fica aqui lançado o repto a quem de direito, e irei certamente repeti-lo sempre que a oportunidade se apresentar.
Explicados os motivos patrióticos por detrás da sua inclusão, escusado será dizer que o Mama-na-Burra é uma personagem que, em virtude daquilo que traz para a mesa, teria lugar em qualquer boa estória de fantasia. Aliando a isso uma dose de misoginia inveterada – resultante de uma experiência particularmente traumática com mulheres e do fervor religioso de quem foi gerado pela graça divina e levou o pecado original demasiado a peito – e temos um dos mais interessantes protegonistas do Felizes Viveram Uma Vez.