Quem é quem – Borralheiro

Nome original: Askeladden
Origem: Noruega
Conto original: Rødrev og Askeladden

… és o Terceiro Irmão. És o Filho Mais Novo, o Borra-Botas que é sempre subestimado por toda a gente mas que, no fim, acaba por ser mais esperto do que todos…

Assim se pode definir em poucas palavras a essência de Borralheiro, uma personagem única entre as demais, e a figura que escolhi como chaveta narrativa para o Felizes Viveram Uma Vez. O arquétipo é conhecido e transversal em contos do mundo inteiro: o do zé-ninguém que, graças à sua astúcia e pureza de carácter, acaba sempre por ser mais bem-sucedido que os irmãos mais fortes ou os rivais amorosos mais bem-parecidos. Descrito na linguagem mais académica de quem costuma analisar contos de fadas, ele representa o individualista, o livre pensador não-conformista, capaz de pensamentos abstractos e analíticos, ou de criar uma mudança de paradigma. Em suma, a personagem ideal para perceber que algo de errado se passou com o mundo em que vive, embora todos os outros pareçam achar que nada aconteceu e que as coisas simplesmente são como são.

O nome «Borralheiro» é até certo ponto um artifício linguístico, mas o rapaz tem de facto o seu grau de parentesco com a bem mais conhecida Gata Borralheira. O seu nome original em Norueguês diz respeito à tarefa de ir soprando o borralho da lareira de forma a que o fogo não se extinga – tradicionalmente a função do membro mais fraco ou inútil do agregado familiar – o que acabava por o deixar sujo de cinzas, tal como a Gata Borralheira, que dormia à lareira para não ter frio. Uma vez que os nomes de ambos se devem à mesma causa e que a palavra «Borralheiro» remete logo para uma associação a um conto de fadas, optei por chamar-lhe isso mesmo.

Confesso que também achei estimulante a ideia de ter uma figura principal fisicamente inapta, depois de tantos anos a escrever sobre músculos e destro manejar de espadas. Por isso, com ou sem pensamentos analíticos e/ou mudanças de paradigma, a minha escolha  teria provavelmente recaído de qualquer forma sobre o Borralheiro aquando da altura de escolher um protagonista para o Felizes Viveram Uma Vez.