Segundo reza a história (alegadamente corroborada por uma foto que tão cedo não tornará a ver a luz do dia) a minha mãe gostava muito de me vestir com um fato de marinheiro quando eu era criança. Trajava-me como um pequeno Pato Donald e passeava-me pelas ruas, porque achava que me ficava bem. Que era giro.
Por sorte, foi moda de pouca dura, e como na altura a minha autoconsciência era pouco superior à de um cão a mirar-se num espelho, esses pouco abonatórios desfiles de rua não deixaram cicatrizes na minha psique. Mas adiante.
Anos mais tarde, também eu achei que seria giro publicar uma série cuja apresentação gráfica remontasse aos livros de contos de fadas do antigamente, com ilustrações e um estilo gráfico diferente daquele que caracterizara as Crónicas de Allaryia. Era uma ideia antiga minha e uma forma de prestar homenagem às estórias maravilhosas dos tomos poeirentos que eu lera na biblioteca da minha avó, aliando o texto ao desenho, que se queria tirante ao estilo infantil das ilustrações de muitos livros desse género, sem contudo o ser. Um compromisso, portanto; um piscar de olho ao leitor: parece para crianças, mas não é; leiam o livro e logo verão.
Meio ano após a publicação do Perraultimato, vejo-me forçado a reconhecer que a ideia não funcionou. Correndo escolas e feiras do livro de Norte a Sul do país, pude constatar que o tiro me saiu pela culatra, tanto no que toca às ilustrações interiores como ao estilo da capa. Os leitores partilhavam a quase unânime opinião de que as ilustrações em nada contribuíam para o livro e que, olhando para a capa, ficaram com a impressão de que eu me tinha mesmo lançado na literatura infantil. Por sua vez, os não-leitores pensaram que se tratava de facto de um livro para crianças ao olharem para a capa, e essa impressão apenas ficou reforçada pelas ilustrações quando folhearam as páginas. As mesmas opiniões foram-me veiculadas através de emails de leitores, muitos dos quais tinham já manifestado algumas reservas quanto ao conteúdo gráfico do Perraultimato mesmo antes do lançamento.
Confrontado com essas evidências, tive de engolir o sapo que decididamente não se iria transformar em príncipe e fazer um mea culpa na Presença, onde desde o início me fora dado a entender que o melhor seria não brincar com as expectativas das pessoas. Feitas as desculpas e ouvidos os «nós bem te avisámos…», e uma vez que não se agradou a gregos nem a troianos, ficou decidido que os próximos livros da série não terão ilustrações, e o estilo das capas será bem diferente. No próximo dia 17 sairá também uma nova edição do Perraultimato, já com a nova capa, que aqui apresento:
Por motivos de ordem técnica (que é como quem diz «monetária») esta nova edição ainda conterá as ilustrações interiores, pois uma repaginação do manuscrito não foi posta na mesa nesta altura. Edições subsequentes deste livro e os restantes volumes da colecção não terão quaisquer ilustrações, e o modelo das capas será doravante este. Para todos os leitores que, tal como eu, têm tendências obsessivo-compulsivas na arrumação dos livros na prateleira, as minhas desculpas. Ter uma prateleira com uma fila de lombadas dissonantes não é, decididamente, nada giro…
Nota: Que isto não se entenda como um repúdio do trabalho do ilustrador Pedro Potier, cujo profissionalismo só tenho de enaltecer. A ideia foi minha, fui eu quem pugnou por ela contra o entendimento de quem é mais entendido que eu nestas matérias, e ele limitou-se a fazer aquilo que pedi. Erro meu, responsabilidade minha.