Blendagens

Blendagem: Mistura para homogeneizar um produto ou uma substância

Não, não me enganei a atribuir a imagem de cabeçalho. Esta não é mais uma entrada das RCPalavras, mas sim toda uma nova categoria, em que finalmente começarei a partilhar algo com que me tenho ocupado desde finais de Dezembro passado.

Como a maior parte de nós, comecei a desenhar bem antes de escrever, e até nem era completamente desprovido de jeito. Fazia banda desenhada e caricaturas dos meus colegas de turma na escola, e cheguei mesmo a desenhar umas quantas páginas de uma saga de super-heróis criados por mim. Mas, como já antes referi, o meu talento para desenhar não conseguiu acompanhar tudo o que a minha imaginação queria expressar, e acabei por me dedicar unicamente à escrita para esse efeito.

No entanto, esse bichinho nunca desapareceu verdadeiramente. Durante a era das capas ilustradas, um dos grandes prazeres após concluir cada livro era colaborar de perto com o Samuel Santos para elaborar a respectiva capa, e muitas vezes «vandalizei» a arte dele para melhor ilustrar o que imaginava. Em retrospectiva, ao fazê-lo, talvez tivesse também sentido que ainda estava a desenhar de alguma forma.

Quando acabaram as capas ilustradas, acalentei umas quantas vezes a possibilidade de voltar à carga. Talvez um dia pudesse eu tratar das ilustrações, pensei. Ou dar suporte gráfico a uma série de projectos que tinha e tenho na calha. Ou até só fazê-lo por carolice e ser capaz de dar vida visual à minha imaginação. Mas não, não ia mesmo dar. O meu potencial para a ilustração tinha-se ficado pela potência, e os meus dedos pareciam demasiado calcificados pela escrita para darem ao lápis.

Mas certo é que a pancada estava lá e por lá ficou. O que, aliado a uma possível crise de meia-idade, me levou a experimentar brincar com um programa muito porreiro chamado Blender, na esperança de que pudesse servir como muleta tridimensional para alguém que tinha perdido o jeito para o desenho. Fi-lo de forma puramente recreativa, a título de descargo de consciência, e quase na expectativa de fracassar miseravelmente para poder tirar esta ideia palerma do sentido. Afinal, enquanto homem casado que trabalha como tradutor e escreve livros, não é como se não tivesse já os dias preenchidos…

Bem me lixei, que agora tenho de arranjar forma de ordenhar mais algum tempo de cada dia, porque a aprendizagem tem corrido bastante bem, estou satisfeito com o meu progresso ao longo de quase sete meses, e começa a perfilar-se a possibilidade bem real de um dia eu ser realmente capaz de tratar da parte gráfica dos meus projectos.

E sim, tenho perfeita noção de que me deu para (re)aprender a desenhar/modelar/esculpir na precisa altura em que a arte por IA explodiu e provavelmente revolucionará a forma como se faz muita coisa nesse âmbito. Mas sempre fui conhecido pelo meu impecável sentido de oportunidade e por fazer as coisas ao meu próprio ritmo, por isso nem me incomodo a pensar nesse assunto, até porque não estou a pensar ganhar a vida com isto, mas sim usá-lo como complemento para o que gosto de fazer, que é criar.

E é isso. Esta foi uma introdução demasiado verbosa para uma nova categoria, na qual partilharei o meu percurso de aprendizagem com o Blender. Já tenho material suficiente para várias entradas, mas isto irá também servir para me pressionar a ir praticando, fazendo mais e ter projectos a apresentar, como este monstro:

Nesta cena que parece saída do primeiro Alone in the Dark, explorei a medo a modelagem, usando formas simples e brincando com luzes numa tentativa de criar ambiente. Ainda era tudo muito novo, e sentia-me avassalado pela quantidade de opções que praticamente cada campo e botão do programa parecia ter. Não sei se me teria aventurado tão cedo nisto, se não fosse pela existência de tutoriais, mas ainda bem que o fiz, porque foi um primeiro passo importante que me deu vontade de explorar mais e me fez redescobrir o prazer de aprender, coisa que já não fazia há quase vinte anos.