Quantas oportunidades haverá numa vida para ver ao vivo o Zrinjski, o clube de futebol da cidade da minha esposa, jogar em Portugal*? É a questão que se põe quando me vejo confrontado com a perda de, pelo menos, um dia de trabalho e escrita a meio da semana, porque há muito tempo que não sou de tirar férias em Agosto.
Acontece que o Zrinjski vem jogar com o Vitória de Guimarães, e não resistimos a ir assistir ao confronto entre a Cidade Berço e a Cidade Que a Ponte Divide. Uma equipa que se pauta pela sua rivalidade contra os vizinhos «marroquinos» irá defrontar outra cuja razão de ser é a oposição ao Velež, os «otomanos» que vivem do outro lado da ponte da sua própria cidade. Mas, se a rivalidade entre a Cidade Berço e a Cidade dos Arcebispos começou devido à dificuldade que os clérigos da Colegiada de Guimarães tinham em aceitar a autoridade do Arcebispo de Braga e foi azedando a partir daí, o Zrinjski e o seu rival Velež têm uma inimizade bem mais figadal, que se divide por linhas genuinamente étnicas, religiosas e da mais pura pirraça.
Para contexto, o Zrinjski foi fundado por um grupo de ilustres herzegovinos na forma de uma sociedade desportiva para jovens em 1905, ainda nos tempos do Império Austro-Húngaro. O nome Zrinjski é inspirado na casa de Zrinski/Zrínyi, uma família nobre croato-húngara que foi particularmente influente durante as Guerras Otomanas. O clube tem um historial atribulado: foi dissolvido pelo Império Austro-Húngaro aquando da 1.ª Guerra Mundial, tal como todas as demais sociedades o foram; foi proibido pela Jugoslávia de jogar num torneio da Dalmácia por ostentar as cores croatas; e banido pelos Partidários por ter participado na liga do Estado Independente da Croácia durante a 2.ª Guerra Mundial, o que lhes mereceu a destruição dos seus registos desportivos e levou a que os rivais bosníacos do Velež se tornassem o clube de maior sucesso da Herzegovina durante o período comunista jugoslavo.
Porém, o Zrinjski «vingou-se» anos mais tarde, depois da Guerra da Bósnia, quando ocupou o estádio dos rivais do Velež (que se encontrava no lado ocidental, de maioria croata) e dele se apropriou até hoje, relegando-os a um estádio fora da cidade. As duas equipas tardaram a defrontar-se novamente, porém, visto que cada um dos três grupos étnicos da nação formou a sua própria liga após a guerra, com o Zrinjski a participar na Primeira Liga da Herzeg-Bósnia, e o Velež a pugnar na Primeira Liga Bósnia. Escusado será dizer que o dérbi de Mostar tem a sua fama, portanto.
Digo isto apenas a título de partilha de curiosidades, sem esperar qualquer confusão para amanhã. A minha esposa afirma sempre sentir-se em casa quando visitamos o Minho, tanto pelas parecenças da paisagem como pelo carácter das gentes, que ela afirma ser em vários aspectos semelhante ao dos herzegovinos. Por isso, espero assistir a um bom espectáculo herzeg-minhoto nesta curta quebra de rotina.
*Pelo menos duas, visto que o Zrinjski já jogou contra o Braga, em 2008, para a Liga Europa…